Em 2019, o Brasil foi classificado dentre os 10 países mais desiguais do mundo pelo índice GINI do Brasil, ferramenta que compara a concentração de renda entre as faixas mais pobres e mais ricas de um país. É importante reforçar então que o tecido empreendedor, presente na economia brasileira, também sofre de tamanha desigualdade. É nesse sentido que as políticas públicas se fazem tão relevantes também no ecossistema empreendedor. Funcionários e estruturas existentes nos governos municipais podem ser o pontapé inicial para facilitar o desenvolvimento de pequenos negócios nas cidades.

Os esforços produzidos a partir dos anos 2000, em escala federal, estadual e municipal, focados em erradicar a pobreza e desenvolver economicamente seus territórios, e com legislações voltadas aos empreendedores em situação de vulnerabilidade, ainda que importantes, produzem poucos resultados para a população de baixa renda. Portanto, acreditamos que o olhar cirúrgico das equipes públicas dos municípios tem o poder de potencializar os resultados, focando nos segmentos da população em situação de exclusão. Do mesmo modo, a visão estratégica local permite investir a atenção especificamente em territórios mais vulneráveis, distintos dos centros econômicos já desenvolvidos, para reduzir as desigualdades espaciais dentro de um mesmo município.

Em nossa Carta Compromisso, destacamos possíveis estratégias que podem ser adotadas para que a infraestrutura pública e o apoio a grupos prioritários fomentem o desenvolvimento do ecossistema empreendedor:

  • Criar um espaço físico de atendimento qualificado para empreendedores de baixa renda onde convergem outras ações de inclusão empreendedora, principalmente para beneficiados do Bolsa Família.
  • Utilizar a estrutura do CRAS como ponto central de contato com essa população e qualificar a sua equipe para assessorar e capacitar os microempreendedores.
  • Identificar a secretaria e/ou equipe responsável pela pasta de inclusão empreendedora e as demais a serem ativadas para definir ações convergentes.
  • Mapear os territórios periféricos e comunidades vulneráveis e garantir o seu acesso aos serviços e programas do município.
  • Desenhar políticas públicas que atendem às necessidades específicas de intersecções sociais vulneráveis como mulheres, negros, indígenas, jovens, pequenos produtores, imigrantes, refugiados, pessoas transgênero, dentre outros.
  • Promover uma comunicação afirmativa que empodere esses grupos sociais e vá contra os preconceitos.
  • Focar em soluções que fomentam redes locais de microempreendedores pertencentes ao mesmo grupo social para garantir ambientes seguros e transparentes.
  • Diversificar a equipe executiva e técnica para corresponder melhor ao perfil dos microempreendedores atendidos.

A série de webinários promovido pelo Empreender 360 e Bank Of America, em parceria com a Firgun e Integração, debateu a inclusão empreendedora nas cidades. Nesta edição inédita de webinários, falamos sobre os pontos de alavancagem para o desenvolvimento de empreendedores de baixa renda, que estão colocados na Carta Compromisso. Esta foi criada com representantes do governo, empresas e sociedade civil, e estabelece diretrizes para a criação de soluções, fomentando o empreendedorismo e economia local, com um olhar especial para as eleições 2020. Nesta série, juntos com vários especialistas e empreendedores do ecossistema, criamos uma oportunidade para esclarecermos as necessidades e apresentar ideias de desenvolvimento social e econômico.

No primeiro webinário, o tema foi o pilar de “Infraestrutura pública”: o governo como parceiro do empreendedor. Florian Paysan (Aliança Empreendedora), Antônio Carlos Borges (SETTDEC), Fernanda Melo (Endeavor) e Victor Párraga (CAMI) nos ajudam a responder sobre quais recursos públicos podem servir à população para melhor atender empreendedores em situação de vulnerabilidade social.

Victor Párraga, do Centro de Apoio e Pastoral do Imigrante (CAMI), apresentou a experiência de 15 anos da organização com trabalho diretamente com imigrantes. Victor ressaltou a tradição brasileira de ser um país de “braços abertos” aos imigrantes de diferentes culturas e a disposição dos imigrantes em trabalhar e contribuir para o crescimento econômico do país, ressaltando que para isso é importante escutar e ouvir as necessidades desta população para melhor integrá-las e formalizar seus negócios.  

A principal atuação do CAMI é estabelecer ponte entre as informações, os direitos e os imigrantes e refugiados, por exemplo, através oficinas de costura, realiza trabalho de base para levar as informações para as populações mais vulneráveis. Para Victor “a essência da atuação da sociedade civil é escutar as necessidades do empreendedor”. 

Antônio Carlos Borges, Secretário de Desenvolvimento econômico de Feira de Santana apresentou as políticas de regularização do comércio informal no centro da cidade, destacando o processo participativo de audiências públicas. Antônio apresentou o projeto de requalificação do centro comercial de Feira de Santana, batizado de Pacto de Feira de Santana, que foi aprovado pelo Conselho Municipal do Desenvolvimento Econômico e envolveu atores locais, como a associação de feirantes, trabalhadores, ONGs, cidadãos e vereadores em um processo no qual se chegou a realizar reuniões com 1.800 ambulantes, feirantes e comerciantes, que receberam incentivos para a regularização de seus negócios e para colocarem suas lojas no espaço de comércio popular que foi construído como parte do plano de ação do projeto urbanístico, o Shopping Popular Cidade das Compras, com 9 mil m². 

A construção do Shopping foi realizada por meio de uma  Parceria Público Privada, um modelo de gestão pioneiro por focar na base da pirâmide social”. 

Fernanda Melo, da Endeavor conversou sobre sua experiência em desburocratização junto a municípios. Reduzir a burocracia excessiva fomenta e democratiza o empreendedorismo, porque é um processo cuja maior parte é responsabilidade dos governos municipais e cujos resultados são rápidos. 

Para ela, os principais benefícios são: 

  • Redução dos custos 
  • Aumento da produtividade 
  • Aumento do acesso a mercados 
  • Aumento da competição local 
  • Aumento do empreendedorismo em regiões periféricas 
  • Maior segurança jurídica aos empreendedores 

Ela destaca que já existem caminhos bem conhecidos sobre como atingir essa desburocratização”, ou seja, não se trata de reinventar a roda mas sim de haver disposição política em encarar o problema. Neste sentido, apresentou três materiais para nortear a implementação de políticas de simplificação elaborados por sua organização: o Índice de Cidades Empreendedoras, o Mapa da Simplificação e o curso de Simplificação de Abertura de Empresas, oferecido pela em parceria com a Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) com foco em gestores públicos municipais.  

Outro desafio que ela coloca é na articulação intersetorial entre diversas secretarias e órgãos de governo, que começa com o conhecimento da realidade local através de evidências, como os rankings empreendedores, que ajudam a conhecer os principais gargalos. Em segundo lugar, conhecer os perfil da atividade econômica de cada região da cidade. Por fim, ela coloca a importância da formalização dos negócios como pré-requisito para dialogar com o poder público, pois tira o temor da fiscalização por parte do Estado.